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ACESSO: 18/03/2016 as 09:13h
O ano de 2016 começou com os jornais noticiando a redecoração das
paredes dos laboratórios de química em todo o mundo. É que, de um
momento a outro, ficaram desatualizados os pôsteres exibindo a famosa
tabela periódica, a lista que organiza os elementos químicos conhecidos
segundo suas características e propriedades. Em um comunicado à imprensa
no dia 30 de dezembro de 2015, a União Internacional de Química Pura e
Aplicada (Iupac) e a União Internacional de Física Pura e Aplicada
(Iupap) reconheceram oficialmente a existência de quatro elementos
químicos descobertos nos últimos anos. São os elementos de número 113,
115, 117 e 118, ainda sem um nome oficial, que se somam aos 114
identificados anteriormente.
Os novos elementos químicos são chamados de superpesados porque
abrigam em seu núcleo um número elevado de prótons (partículas de carga
elétrica positiva), muito superior ao dos elementos químicos encontrados
na natureza. É esse conjunto de prótons, o chamado número atômico, que
distingue um elemento químico do outro e define muitas de suas
características. Por exemplo, o carbono, que constitui a maior parte da
massa dos seres vivos, abriga em seu núcleo apenas seis prótons. À
temperatura ambiente e puro, o carbono forma cristais que podem ser
negros e macios, caso da grafite, ou transparentes e duro, como o
diamante, dependendo de como os átomos estão geometricamente
organizados. Já o elemento químico natural mais pesado, o urânio, é um
sólido metálico bastante denso e radiativo. Tem 92 prótons e, ainda
assim, é bem mais leve que os quatro acrescentados agora à tabela
periódica.
Os novos elementos são dificílimos de observar e não devem existir
espontaneamente na natureza – ao menos, não por muito tempo. Por terem
núcleos superpesados, são tão instáveis e fugazes que se desfazem em
frações de segundo. A existência deles só pôde ser confirmada por meio
de uma série de experimentos realizados ao longo da última década.
Um dos poucos laboratórios capazes de fabricar esses elementos está
no Instituto Riken, no Japão. Foi lá que, em 2004, identificou-se o
elemento 113. Outros laboratórios com a mesma capacidade estão no
Instituto Conjunto para Pesquisa Nuclear, em Dubna, na Rússia, e em
centros nos Estados Unidos. Uma colaboração entre uma equipe de Dubna e
pesquisadores norte-americanos, a maioria do Laboratório Nacional
Lawrence Livermore, produziu o elemento 115 em 2004, o 118 em 2006 e o
117 em 2010.
Com os quatro novos elementos químicos, somados aos elementos 114 e
116, cuja existência foi reconhecida em 2011, finalmente foram
preenchidos todos os espaços vagos na sétima linha da tabela periódica.
“Só nos últimos 50 anos, 17 novos elementos químicos foram acrescentados
à tabela, do 102 ao 118”, diz o físico Edilson Crema, do Instituto de
Física da Universidade de São Paulo (USP).
“Quando o químico francês Antoine Lavoisier publicou em 1789 o Tratado elementar de química,
considerado um marco da química moderna, a obra listava apenas 33
elementos”, observa o químico e historiador da ciência Carlos Alberto
Filgueiras, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Naquela
época a identificação de novos elementos químicos dependia do
desenvolvimento de produtos e métodos de extração para estudar os
minerais. “A análise das propriedades de novos minerais muitas vezes
revelava a presença de um elemento químico até então desconhecido”,
explica.
A tabela periódica só surgiria no final dos anos 1860. Os químicos já
haviam então percebido que os elementos, enfileirados em ordem
crescente de massa atômica (a soma de seus prótons e nêutrons), formavam
séries com propriedades físicas e químicas semelhantes, que se repetiam
periodicamente ao longo da fila. A partir dessas observações, o químico
russo Dmitri Mendeleev ordenou os 65 elementos identificados até então
no que chamou de tabela periódica dos elementos químicos. Ele previu a
existência de outros, como o gálio e o germânio, só descobertos anos
depois.
Depois de preencherem quase todas as lacunas da tabela periódica
entre o hidrogênio, que tem 1 próton, e urânio, com 92, começou-se a
usar aceleradores de partículas nos anos 1940 para tentar produzir
elementos químicos mais pesados que o urânio. Os primeiros elementos
químicos sintéticos eram formados pela adição de um nêutron, que, ao
aderir ao núcleo, converte-se em um próton, liberando um elétron e um
neutrino. Essa estratégia funcionou até o férmio, que tem 100 prótons. A
partir daí, os elementos pesados passaram a ser criados pela colisão e
fusão de dois núcleos mais leves.
A produção desses elementos exige um ajuste fino entre as massas dos
núcleos e a energia com que são lançados uns contra os outros. É que a
colisão tem de ocorrer com energia suficiente para vencer a força de
repulsão entre os núcleos, que têm carga elétrica positiva. Mas a
energia não pode ser elevada demais a ponto de impedir a formação de um
núcleo maior e estável, ainda que por instantes. O objetivo dos físicos
não é apenas fabricar elementos químicos novos. Essa é também uma forma
de testar as teorias sobre como prótons e nêutrons interagem e a matéria
se comporta num nível ainda mais elementar. Essas teorias explicam como
os elementos mais leves – como hidrogênio, hélio e lítio – se formaram
na explosão que teria dado origem ao Universo, o Big Bang, e depois
produziram os demais elementos por fusão nuclear no interior de estrelas
e durante as explosões que as extinguem.
O núcleo dos átomos é uma região em constante tensão. Os prótons se
repelem mutuamente por terem carga elétrica de mesmo sinal, positiva. Só
se mantêm unidos pela ação de uma força contrária, de atração: a força
nuclear forte. Esse equilíbrio entre essas forças é bastante delicado.
Segundo Crema, os núcleos, além de prótons, contêm certo número de
nêutrons, partículas eletricamente neutras. “Os nêutrons são uma espécie
de estabilizadores nucleares”, diz. “Núcleos com muitos prótons exigem
um número ainda maior de nêutrons em relação ao número de prótons, o que
torna mais difícil formar núcleos superpesados.”
Uma teoria chamada de modelo de camadas propõe que, no núcleo dos
átomos, os prótons e os nêutrons se encontram organizados em camadas
concêntricas, cada uma delas comportando um número máximo de partículas –
o chamado número mágico. De acordo com esse modelo, quanto mais
completa a camada externa de um núcleo, mais estável ele é. Essa ideia,
em princípio, explica por que alguns núcleos pesados se desmancham
facilmente enquanto outros existem por mais tempo. Os físicos esperam
fabricar elementos contendo números mágicos de partículas. Eles teriam
chance de se manter estáveis por vários anos e permitiriam iniciar uma
oitava ou até mesmo nona linha na tabela periódica. “Mas isso”, diz
Crema, “ainda é só conjectura e esperança”.
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