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ACESSO: 12/03/2016 as 10:59h
Empregar a nanociência para elevar a produtividade de poços de
petróleo, extraindo de reservatórios submarinos e continentais o óleo
que não é recuperado pelos métodos tradicionais, é o objetivo dos
estudos do físico Caetano Miranda, professor do Departamento de Física
de Materiais e Mecânica do Instituto de Física da Universidade de São
Paulo (IF-USP). A ideia central do pesquisador, que recorre à modelagem
computacional para simular o interior de poços de petróleo em escala
micro e nanométrica, é usar nanopartículas de óxidos, como a sílica,
impregnadas com surfactantes – substâncias utilizadas pelas empresas
petrolíferas na exploração das reservas – para extrair o petróleo
aderido às rochas que formam os reservatórios. Hoje, apenas 35% do óleo
contido nos poços é extraído, em média. A finalidade da nova técnica é
dobrar esse percentual.
Para compreender como as nanopartículas de sílica irão atuar na
exploração petrolífera, é preciso entender que tanto o óleo quanto o gás
não estão armazenados em bolsões ou grandes cavernas subaquáticas ou
subterrâneas. O óleo e o gás se acumulam em espaços vazios de rochas
sedimentares porosas, como se fossem água em uma esponja encharcada.
Quando o poço é perfurado, parte do óleo flui naturalmente, por causa da
diferença de pressão – mais elevada no reservatório e menor na
superfície. “Nessa recuperação primária, são extraídos em torno de 5% a
15% do total de hidrocarbonetos armazenados no depósito. Esse percentual
varia conforme certos fatores, entre eles o tipo de rocha que forma o
reservatório e características do óleo, como sua viscosidade, por
exemplo”, explica Miranda.
No momento em que o poço começa a reduzir sua produção, as petrolíferas injetam nele água, gás carbônico (CO2)
e nitrogênio para deslocar o petróleo ainda presente no reservatório.
Esses fluidos são introduzidos nos poços a certa distância do local de
produção e têm ação puramente mecânica, empurrando o óleo em direção à
coluna de perfuração. Nesse processo de recuperação secundária do óleo
chega-se à média de 35% do volume extraído na maioria dos poços do
planeta.
A partir desse ponto, se estudos das petrolíferas comprovarem que há
viabilidade econômica, elas continuam explorando o reservatório,
injetando no poço surfactantes para fazer o deslocamento do óleo
residual. “Surfactante é um produto semelhante ao sabão que altera as
interfaces entre o óleo, a rocha e a água salgada, os três componentes
do sistema. Ele diminui as tensões interfaciais desses componentes nos
reservatórios, modificando a viscosidade do óleo e fazendo com que se
desloque mais facilmente”, explica Miranda. Essa substância, porém,
apresenta dois problemas. O primeiro é o custo elevado. A petrolífera
precisa usar grandes volumes de surfactante, o que implica uma complexa
logística de transporte, porque a maioria dos poços se encontra em
lugares remotos. O segundo problema é que surfactantes são intolerantes à
alta salinidade e à elevada temperatura.Nessas condições, eles
precipitam, depositando-se na superfície das rochas. Quando isso
acontece, eles não alteram a viscosidade do óleo residual, essencial
para sua recuperação.
As pesquisas com uso de modelagem computacional feitas por Miranda
recaem justamente na escolha do melhor material para fazer o papel de
surfactante. O pesquisador estuda nanopartículas capazes de auxiliar na
extração de óleo e gás retidos em nanoporos e microporos das rochas e,
ao mesmo tempo, procura compreender o comportamento dessas
nanoestruturas. “Não sabemos o que ocorre com o petróleo ou o gás
natural quando eles estão confinados nos nanoporos. Sequer conhecemos o
percentual de óleo e gás retido neles”, diz Miranda.
O trabalho também teve como desafio tornar funcionais as
nanopartículas de sílica com um surfactante, a fim de potencializar sua
ação. “A partir de simulações moleculares, tentamos descobrir qual seria
o melhor produto a ser adicionado na nanoestrutura, já que existem
muitos no mercado. A nanopartícula de sílica, em si, altera a interface
entre o óleo, a rocha e a salmoura, mas com o acréscimo de um
surfactante essa ação fica mais eficaz”, diz Miranda. “Queremos entender
por que ele altera a molhabilidade do óleo.” Molhabilidade é a
capacidade de um líquido em manter contato com uma superfície sólida
quando os dois são colocados juntos. “Recorremos à simulação em
computador por causa do custo-benefício. Fazer os ensaios dos
surfactantes nos reservatórios seria custoso e demorado demais.” No caso
de funcionar com as nanopartículas de sílica, a quantidade e o custo do
surfactante serão bem menores em relação ao volume utilizado sozinho.
Outra vertente da pesquisa é estudar nanoestruturas que possam ser
empregadas para “iluminar” os campos de petróleo, extraindo mais
informações dos reservatórios, como, por exemplo, detalhes sobre a
porosidade das rochas, os fluidos presentes nelas, a composição química e
as condições de temperatura e pressão do ambiente. Essas informações
são essenciais para as tomadas de decisão da equipe de engenharia de
produção. O uso de nanopartículas, segundo Miranda, poderia aprimorar a
resposta da ressonância magnética feita durante a perfuração – a técnica
é empregada para mapeamento dos depósitos. Para isso, nanopartículas
seriam injetadas no poço junto com a água, servindo como agentes de
contraste. “De uma maneira geral, nossos estudos buscam uma melhor
compreensão, em escala molecular, dos mecanismos e fenômenos que ocorrem
em poços de petróleo. Queremos ter uma visão atomística do processo e
verificar as consequências em escalas maiores”, afirma.
Códigos computacionais
Três teses de doutorado, quatro dissertações de mestrado e mais de uma dezena de artigos foram produzidos nos últimos oito anos no âmbito das pesquisas de Caetano Miranda. Seu trabalho tem vinculação com um projeto de quatro anos financiado pela FAPESP e coordenado pelo físico Alex Antonelli, do Instituto de Física Gleb Wataghin da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). “Nosso projeto tem como finalidade estudar uma varidade de propriedades da matéria condensada por meio da modelagem computacional. Caetano utiliza as mesmas ferramentas que empregamos e, por isso, podemos compartilhar tanto os computadores quanto os códigos computacionais”, afirma Antonelli. “Em princípio, podemos compreender no computador, que funciona como um laboratório virtual, os processos já conhecidos e possivelmente melhorá-los de uma forma mais barata, sem ter que testar uma nova ideia na prática.”
Três teses de doutorado, quatro dissertações de mestrado e mais de uma dezena de artigos foram produzidos nos últimos oito anos no âmbito das pesquisas de Caetano Miranda. Seu trabalho tem vinculação com um projeto de quatro anos financiado pela FAPESP e coordenado pelo físico Alex Antonelli, do Instituto de Física Gleb Wataghin da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). “Nosso projeto tem como finalidade estudar uma varidade de propriedades da matéria condensada por meio da modelagem computacional. Caetano utiliza as mesmas ferramentas que empregamos e, por isso, podemos compartilhar tanto os computadores quanto os códigos computacionais”, afirma Antonelli. “Em princípio, podemos compreender no computador, que funciona como um laboratório virtual, os processos já conhecidos e possivelmente melhorá-los de uma forma mais barata, sem ter que testar uma nova ideia na prática.”
Apoio das petrolíferas
Além da FAPESP, Miranda também recebe financiamento da Petrobras. Suas pesquisas se inserem no programa de Redes Temáticas da estatal, instituído em 2006 e executado em parceria com pesquisadores de universidades e instituições nacionais de pesquisa. “O trabalho do professor Caetano faz parte da Rede Temática Recuperação Avançada de Petróleo”, afirma a engenheira de petróleo Lua Selene Almeida, do Centro de Pesquisas da Petrobras (Cenpes). “É um estudo muito avançado e de fronteira. Ele está nos ajudando a modelar fenômenos físicos que ocorrem nos poços de petróleo numa escala bem distinta daquela que estudamos em nossos laboratórios”, diz a pesquisadora.
Além da FAPESP, Miranda também recebe financiamento da Petrobras. Suas pesquisas se inserem no programa de Redes Temáticas da estatal, instituído em 2006 e executado em parceria com pesquisadores de universidades e instituições nacionais de pesquisa. “O trabalho do professor Caetano faz parte da Rede Temática Recuperação Avançada de Petróleo”, afirma a engenheira de petróleo Lua Selene Almeida, do Centro de Pesquisas da Petrobras (Cenpes). “É um estudo muito avançado e de fronteira. Ele está nos ajudando a modelar fenômenos físicos que ocorrem nos poços de petróleo numa escala bem distinta daquela que estudamos em nossos laboratórios”, diz a pesquisadora.
Outra fonte de financiamento dos estudos vem do Advanced Energy Consortium
(AEC), consórcio internacional de empresas do setor de petróleo, entre
elas a anglo-holandesa Shell, a inglesa British Petroleum (BP), a
norueguesa Statoil, a espanhola Repsol, a francesa Total e a Petrobras,
voltado ao financiamento de nanociência aplicada à indústria do
petróleo. O projeto apoiado pela AEC contou com a participação de
pesquisadores da Universidade de Austin, no Texas, um importante centro
de estudos no setor de óleo e gás. “Enquanto nosso grupo fazia as
simulações em computador, eles se encarregavam da parte experimental”,
diz Miranda, destacando que testes laboratoriais e ensaios
experimentais, etapas que precedem aos experimentos com as
nanopartículas de sílica nos campos de petróleo, também serão realizados
em breve no IF-USP.
“As simulações computacionais são muito mais baratas e apresentam
menos riscos do que os experimentos de laboratório”, diz a química
Flávia Cassiola, pesquisadora brasileira da Shell Internacional,
Produção e Exploração, em Houston, nos Estados Unidos. “A indústria do
petróleo tem todo o interesse que os métodos se aprimorem,
proporcionando a inclusão de mais características dos reservatórios na
simulação. A Shell possui vários grupos dedicados à simulação
computacional em seus centros de tecnologia e inovação e o professor
Caetano é a nossa referência no assunto. O trabalho dele tem nos
auxiliado no desenvolvimento e aprimoramento de métodos avançados de
recuperação de petróleo e gás natural”, diz Flávia.
Projeto
Modelagem computacional da matéria condensada: uma abordagem em múltiplas escalas (nº 2010/16970-0); Modalidade Projeto Temático; Pesquisador responsável Alex Antonelli (IFGW-Unicamp).
Modelagem computacional da matéria condensada: uma abordagem em múltiplas escalas (nº 2010/16970-0); Modalidade Projeto Temático; Pesquisador responsável Alex Antonelli (IFGW-Unicamp).